Quando o autor coloca um ponto final no texto, uma nova história começa a ser contada.

É o momento em que a leitura vai além do ponto...

Inajá Martins de Almeida

quarta-feira, 25 de setembro de 2024

O SEGREDO DA LIVRARIA DE PARIS - Lily Graham

 "Os jovens não pensam nos velhos desse jeito. Não veem as cicatrizes deixadas pelo tempo, os sofrimentos, as alegrias. Veem apenas o rosto inexpressivo da velhice". (pág 7)

"A velha senhora do trem não arecia ser o tipo de pessoa que carregava um segredo sombrio ardendo no fundo do peito. Um segredo daqueles que se contorcem em volta do coração, apertando, pronto para explodir. Mas ela carregava . (pág.7)


Assim, Lily Graham inicia sua fala em "O Segredo da Livraria de Paris", presente da amiga secreta Jacqueline, Natal 2021, o qual promete muitos encontros e desencontros, quem sabe...

A mala pesada de memórias emolduradas - "quanto mais velha a pessoa fica, mais pesadas elas ficam..." - fotografias.

"Gosto de manter as pessoas que amei por perto, onde quer que eu vá... o lar, onde quer que a gente vá, é ... lindo" (p.8/9)

Passo a perceber fotos, as quais, muitas não as tenho mais, entretanto, claras em minha mente. Talvez até mais seguras, pois que não ocupam espaços externos.

A velhice, o avançar dos anos, tem me proporcionado novo aprendizado. Parece até que autores e livros me chegam como inspiração,como se a conhecerem meus anseios, meus avessos, minha busca pelo encontro do meu passado e presente, com vistas ao futuro, quando então passo a esboçar minha auto biografia, ainda que fragmentada pelo tempo de distância, lembranças e, muitas vezes até desnecessárias para o papel, julgo.

O livro, não o distancio. As páginas não avançam. Cada retorno trazem-me subsídios do passado, de um olhar penetrante que me acompanhou vida toda. Um sorriso enigmático. Um quê não decifrável. Uma fala que implorava pela continuidade daquele momento singular. Um cartão acompanhado de uma suplica:

_ Senhora me ligue, por favor.

Então... Que segredos esconderia aquele que, furtivamente descia pelas escadas e se voltava àquela jovem, repleta de sonhos que permanecia inerte ante a expectativa de tornar a se encontrar com aquele homem, quem sabe até, pudesse trazer alegria e conforto, o qual não encontrava num casamento marcado pelo equívoco dos anos de namoro.

O silêncio pairou no ar. O salão, repleto de convidados, a maioria estranho, tanto no idioma, quanto na cultura, abriu leque para a jovem senhora entender que aquele ambiente não seria suficiente para proporcionar a realização de que, há muito ansiava - trabalho, estudo, família, filhos, um casamente repleto de harmonia, amor, convivência, compartilhamento.

Não! Não via naquele homem, sorriso ímpar, cabelos negros, inteligente, atributos que muitas mulheres almejam, o qual dissera sim no altar, o qual julgara compartilhar de uma vida a dois até os momentos derradeiras, não mais conseguia enxergar naquele homem a continuidade da promessa. A taça, quebrara-se. A tristeza adentrara o coração. A jovem se entristecia, se distanciava, agoniava-se ante os passeios que não escolhia, os amigos que não pertencia ao seu universo. 

Entretanto, agora, o que teria acontecido naquele salão? Seriam as melodias, os arpejos sonoros das guitarras e harpa. As canções inflamadas. Os ritmos latinos. Seria então possível que, apenas um olhar, um sorriso, uma fala contagiante, pudessem permanecer e ocupar, durante semanas,  os espaços vazios daquela jovem que sonhava, que olhava o cartão, sentia-lhe o cheiro de perfume de homem maduro, repleto de enigmas, interrogações?

Seria, pois a proposta do livro que adentrava meu imaginário e me conduzia àquela velha senhora do trem, a confrontar meu passado, repleto de interrogações, reticências, cenas inacabadas, falas truncadas?

Por que, então, passo a me questionar, não retornei, quando ainda era possível o confronto entre o que se escondia por ente as ausências daquele homem que lhe afastara do seu conto de fadas? Por que não lhe atribui parcela da culpa e dor que carreguei por longos anos, quiçá ainda carregue? Por que me calei por décadas? Por que não busquei por respostas, quando ainda as poderia encontrar? Por que tantas lágrimas me sobrevieram quando do encontro do processo, via internet, a notícia de sua morte. Estava ali consumado qualquer prerrogativa de encontro,de confronto, de retorno ao passado.

Agora, me vem a leitura, me aparece a velha senhora do trem e me traz à tona situações não vividas. E as linhas me requerem, como se consigo trouxessem a lenitivo para continuar os anos derradeiros sob uma ótica em que o final possa ser determinado de acordo com a visão de que o "foram felizes para sempre" possa, ou pudesse, ser possível.

O livro. Não consigo me desvencilhar das primeiras páginas, enquanto minhas memórias permanecem lúcidas, tranquilas; quando o retorno me é possível e me faz entender que as mágoas, ficaram naquele vazio, pelo adeus que não fora possível.

Afinal, o que teria mudado se decorridas décadas, o caminho da volta pudesse ser empreendido? Haveria tempo de recomeçar de onde se tinha parado? Outra interrogação sem resposta.

Por que tudo retorna agora por meio dessa linhas, onde os apontamentos me encaminham à minha própria história, um enredo que, por todos esses anos estivera sepultado, entre os escombros de uma construção que se iniciara, mas que vendavais turbulentos puderam destruir alicerces que, de frágeis, não suportaram as intempéries que se levantaram durante anos turbulentos de convivência, ainda que o filho, desse encontro fortuito, repleto de imagens, projetos e sonhos de uma jovem que sonhava, ante aquele cartão, pudesse conduzir a trama de maneira a mais harmoniosa possível? Por que, ainda continuo a indagar...   

Afinal! É possível fugir para os livros, depois que mergulharmos nos braços de uma homem, sem colete salva vidas? Ademais, adentrar nosso próprio universo, em busca de nossos personagens, criar falas, possibilidades outras para o conteúdo. Dar-lhe início, meio ao mesmo tempo em que proporcionar-lhe fim distinto? Desenrolar a trama do passado, de acordo com nossa ótima presente?


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Eis que algumas falas as trago para estas linhas, quiçá, ainda escreva algo mais...


"No brilho daquela beleza, todos os horrores do passado roam iluminados sem piedade. Toda chateação engolida, todo revide reprimido, todo gesto de rejeição. Marianne lamentava tudo aquilo, e esse lamento profundo fez com que se arrependesse de suas covardias". Pág. 47 - grifada)

"Aprenda a amar o que você faz, não importa o quê, assim não terá nenhum problema. Você vai sofrer,mas então vai sentir, e, quando sentir, então estará vivendo. As dificuldades são necessárias para viver; sem elas, você morre.!" (pág. 52 - grifada)

"Todas as lágrimas que uma mulher chora durante a vida - de paixão, saudade, felicidade, emoção, fúria, amor e dor - todos os fiordes de águas agitadas, eram aliviadas pelo olhar dos amigos". - (pág.65 - grifada)

"Ali havia um silêncio vivo... Era o silêncio entre as palavras que emocionava... Não sei que preço  vale pagar pelo amor. Ou o que os homens pensam sobre ele. Sobre ele e sobre a capacidade de lidar com conflitos". (pág.73 grifos)

"Às vezes o amor tem suas facetas estranhas. O amor. Esse sentimento que aumenta de tamanho diante da morte... (pág. 89 grifos)

"Vamos ver que mulher você está escondendo. E quando a encontrarmos, não vamos brigar com ela, querendo saber onde estava esse tempo todo". (pág. 122 - grifo)

"Agir de forma implacável talvez seja necessário quando se começa a tomar as rédeas da própria vida... (pág. 123 - grifos)

"Roupas podiam mudar um mulher? Não. Mas podiam fazer com que ela se redescobrisse... feminilidade". pág. 124

"Apenas a pedra e os quadros eram imortais...

Nunca havia sentido tanta fome de vida: seu coração ameaçava explodir de angústia por ter perdido tantas coisas... está história está longe de terminar! A cada segundo você tem a chence de recomeçar. Abra os olhos e veja:o mundo está aí, e ele te quer". págs. 132/133 - grifos)

"Um silêncio de expectativas... pág. 140 - grifo

"Dizem que se reconhece o caráter verdadeiro de uma mulher pela música. Há quem leia as notas como uma imagem. Analítica e fria. Outras emprestam a cada tom um sentimento. E algumas são cruéis, porque seu único amor é a música. Só à música entregam a verdade e a paixão, a dominação e o controle. Ninguém mais se aproxima delas tanto quanto a música, quanto o instrumento que usam como dono de seus amor... pág. 143 - grifo   

"Uma pessoa pode desperdiçar metada da vida olhando apenas para o homem que praticamente só lhe causou a dor" - pág. 177 - grifo   

"Acho isso uma estupidez - mas só recentemente - antes você também era estúpida e nem percebia. Tudo era mais sagrado que você, e seus desejos eram os mais profanos... As pessoas não mudam nunca!Nós nos esquecemos de nós mesmas. E, quando nos redescobrimos, pensamos que mudamos. Mas isso não é verdade. Não se podem mudar os sonhos, apenas matá-los. E alguns de nós somos assassinos muito bem sucedidos. Eu ainda estou procurando os restos do meu sonho"... pág. 178 - grifo

"Quando se é jovem e não se sabe nada do amor e do mundo, é natural pensar de forma estúpida e agir de forma estúpida." - pág. 181 - grifo

"Quantos desvios, atalhos e mudanças definitivas de rota uma mulher pode tomar até encontrar seu caminho - e tudo porque ela se adapta cedo demais, cai cedo demais na corda bamba do código moral, defende-se de velhos tarados e de suas criadas - as mães que querem apenas o melhor para as filhas. E então perde um tempo enorme se refreando para  se ajustar às convenções! e depois sobra muito pouco tempo para corrigir o destino... Marianne de repente teve medo de perder a coragem para continuar buscando o seu caminho. E ainda assim, a vida da mulher determinada não é um mar de rosas. É um grito, uma batalha, é uma preparação diária contra a acomodação. Eu tive de me acomodar. Viver como menos perigo, não ousar, não fracassar". pág. 196/197 - grifo 

... "ela chorou pelo homem perdido e pela mulher que ela fora e que se perdera... como aquela mulher protegia com rigor seu amor, sem permitir que ele voltasse a ter asas!" pág. 203 - grifo

"Não se pode dizer ao amor: venha e fique para sempre. Só podemos cumprimentá-lo quando ele vem, como o verão, como o outono, e, quando o tempo termina e ele se vai, ele se vai... como a vida. Ela vem e, quando chega a hora, se vai. Como a felicidade. Tudo tem seu tempo." pág. 219 - grifo 

"Não sei porque nós, mulheres, acreditamos que abdicar de nossos desejos nos tornará pessoas mais dignas do amor dos homens. O que temos na cabeça? Quem abdica de seus desejos merece mais amor do que aquelas que perseguem seus sonhos?

Era exatamente isso o que eu pensava. Quanto mais eu sofria, mais feliz ficava. Quanto mais desistia, mais forte ficava minha esperança de que Lothar me daria aquilo de que eu precisava. Eu pensava que, se não quisesse nada, não fizesse nenhuma acusação, não exigisse meu próprio quarto, meu próprio dinheiro, não provocasse nenhuma briga, um milagre aconteceria. Que ele diria: Ah! 

Quantas coisas você abandonou! Como meu amor cresceu por você ter se sacrificado por mim".

Que louca eu fui. Estava tão orgulhosa de mim mesma e da minha capacidade de sofrer; queria ser perfeita nisso. Quanto maior minha aceitação resignada, maior seria o amor de um dia. E a maior renúncia, a renúncia à minha vida, me garantiria o amor imortal do meu marido.

A pessoa deve ganhar o amor com sofrimento?... Quando começou a chorar, chorou pelo amor que não sentia mais por Lothar; e também pelo amor do qual ela mesma havia se privado". pág. 239/240  - grifo

"Felicidade é quando amamos o que precisamos e quando precisamos do que amamos. E conseguimos". pág. 251 - grifo

" O amor das mulheres suspende todas as fronteiras, ultrapassa a morte e o tempo". pág. 253 - grifo


Entrevista Nina George

Sem o trabalho, qualquer talento é apenas um anseio difuso e uma força não utilizada... talento se transformou em capacidade, o meu serrar de toras se transformou em arte de esculpir palavras


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